Memórias...

Através deste texto apresento um relato da minha formação humana, profissional e acadêmica com o objetivo de reconstituir minha trajetória e os registros da minha história profissional, requisito necessário para crescimento na carreira docente e para a gestão consciente desta mesma carreira tendo em vista que a construção contínua do memorial, possibilita ao professor e pesquisador manter-se atento à evolução das suas produções profissionais e humanas. O presente memorial, terá também a função de informar a todos quantos o lerem, sobre a minha vida escolar e profissional as particularidades da minha formação desde a tenra idade até as Especializações realizadas; do primeiro emprego na área docente às minhas atuais ocupações e aspirações futuras.




1. MINHA FORMAÇÃO ACADÊMICA

Era fim de tarde e as crianças começavam a chegar. Avizinhavam-se da mesa da cozinha, puxando as cadeiras e bancos existentes no local. Pouco a pouco, sentavam abrindo os cadernos para fazer a lição do dia. Lápis e borracha nas mãos, olhos atentos em minha mãe. Todos obedeciam às suas “ordens de ensinamentos”. Minha mãe nem era professora formada, mas ela se fazia protagonista de tanta coisa. Uma delas era ensinar gratuitamente aos filhos dos vizinhos como se fosse uma gostosa brincadeira. Nessa “brincadeira” eu cresci. Minha mãe foi meu primeiro modelo de educadora.

Tive um pai caminhoneiro que me carregava na boleia do caminhão e que passava quase parando em cada placa do caminho para que eu pudesse ler e ser aplaudida a cada sílaba ou palavra pronunciada. Gostava de exibir aos amigos como era falante e inteligente a garotinha dele. Meu pai me presenteou com as minhas primeiras platéias além de ser meu mais fiel ouvinte e admirador. Meu pai me fez compreender e sentir que eu faço o trabalho mais digno e gratificante da face da Terra

Sempre gostei de brincar de escola e normalmente ser a professora reproduzindo as ações, falas e posturas dos professores que tive. Quem diria que tive que levar umas palmadas de meu pai para ficar na primeira escolinha.

Minha segunda professora foi minha amiga até pouco tempo quando veio a falecer. Ensinou-me as primeiras letras da Casinha Feliz e os primeiros acordes do piano, depois que virei adolescente. Foi um belo reencontro!

Na Escola Paroquial de Jacobina tive as primeiras lições para a escolha profissional que fiz na maturidade. Nessa escola descobri o que é um aluno com necessidades especiais, pois lá era mantida uma Classe Especial, que povoava minha imaginação de mitos e fantasias. Apesar de estudarmos na mesma escola o contato dos alunos normais com os especiais não era permitido. Tais alunos chegavam mais tarde a escola e saiam mais cedo e o horário do recreio era diferenciado. Porém, eu não me dava por vencida: Todas as vezes que os alunos especiais estavam no recreio, eu tinha vontade de ir ao banheiro. Ia somente para observá-los e brincar um pouco naquela sala maravilhosa, cheia de brinquedos legais e coloridos que não existiam na sala dos “normais”.

Permaneci na Escola Paroquial até a 4ª. Série quando tive que mudar para o Centro Educacional Deocleciano Barbosa de Castro, que recebia os alunos a partir da 5ª. Série. Lá permaneci até concluir meu 2° Grau em Magistério.



2. MINHA FORMAÇÃO ACADÊMICA E PROFISSIONAL

2.1 MAGISTÉRIO: O DESPERTAR PROFISSIONAL

Fazer o Curso de Magistério era praticamente uma tradição para as moças de minha cidade, Jacobina. Era promessa de reconhecimento social e emprego para as alunas bem sucedias que como eu, tinha o “dom” para ser professora conforme dizia minha família e professores.

No segundo ano do curso 1986, eu já estava empregada em uma escolinha particular. Já havia estreado na profissão e já punha em prática o que aprendi nas aulas de Didática, Jogos e Recreação, Prática Pedagógica, Psicologia da Educação. Pude experimentar os olhinhos dos alunos e ensinar-lhes a olhar um livro com o mesmo desejo de que olha o doce favorito. Lanche derramado, chulé, areia no cabelo, chiclete na roupa nova e uma imensa coleção de memórias para a vida.

Até hoje recordo os nomes dos meus doze primeiros alunos que me permitiram questionar na prática, as teorias ensinadas no Curso de Magistério. Tive praticamente uma formação em serviço, pois consultava sempre os professores sobre as dúvidas que tinha na profissão. Foi uma troca maravilhosa, tive verdadeiros Mestres que foram generosos ao me orientar dirimindo dúvidas e sugerindo atividades e posturas.

Em 1987, fui convidada a trabalhar em um colégio particular da cidade o Colégio Yolanda Dias Rocha. Trabalhei por oito anos entre a Educação Infantil e a Primeira Etapa do Ensino Fundamental. Em seguida fui convidada a ser coordenadora pedagógica do colégio, função que desenvolvi por quatro anos, até me dedicar unicamente ao Ensino Público.

2.2 GRADUAÇÃO EM LETRAS NA UNEB

Antes de iniciar o curso de Letras eu já havia prestado concurso Público para professor e já trabalhava na APAE de Jacobina. Na verdade queria fazer Pedagogia, porém o curso não era oferecido em minha cidade. Relutei um bom tempo até decidir fazer Letras. Resolvi fazer o curso por causa de minha identificação com arte e principalmente com a Literatura. Na época da Licenciatura, por já saber o que queria, dei sempre ênfase aos estudos nas disciplinas que me ajudariam a ser uma professora melhor: Literatura Infantil, Didática, Psicologia e, por outro lado satisfazia a minha vontade de leitora. Passei os quatro anos do curso pensando em como fazer para que a democratização do conhecimento fosse facilitada através do ensino eficaz da Língua Portuguesa. Não interessava saber os conteúdos daquela formação, se não soubesse também como fazer para que muitas pessoas tivessem acesso a todo esse conhecimento, pois ler não deveria ser um privilégio de poucos. Como professora não podia me conformar em saber sem compartilhar, afinal para que serve saber? Preocupei-me em ensinar as crianças a gostarem de ler utilizando os conhecimentos obtidos no Curso de Letras.

Como presidente do Diretório Acadêmico de Letras promovemos o I ELUNEB – Encontro de Letras da UNEB, que reuniu em Jacobina, estudantes de vários Campi em torno de questões relativas ao curso e suas aprendizagens. Foi um momento ímpar, espaço de debates e de assumir compromissos com o curso e nossa formação.

A formação universitária funcionou para mim como um grande laboratório, espaço de questionamentos da realidade e de elaboração de propostas de mudança. Tornei-me mais sensível, atenta a realidade da educação pelas oportunidades de discussão que tive em diversos setores desde a sala de aula à liderança estudantil. Fortaleci princípios e rompi paradigmas. A UNEB foi meu grande berço intelectual, alimentou meu saber e minha consciência política.

2.3 COMPROMISSO ASSUMIDOS COM A ESPECIALIZAÇÃO

Como professora da Educação Especial e Licenciada em Letras possuía o compromisso político em me especializar na área de atuação. Em 1999, fiz seleção para o primeiro curso de Educação Especial oferecido pela Universidade Estadual de Santa Cruz, quando descobri que ao invés de Especial a Educação deveria ser Inclusiva, disseminadora da cultura da paz e da tolerância, o que hoje podemos chamar de educação contemporânea preocupada com a formação dos seres humanos, contrária a perpetuação dos guetos e a produção de “refugos humanos”.

Tive mestres inesquecíveis que me fizeram questionar minha prática, meus valores, minha Instituição Especializada, minha existência. Maria Tereza Mantoan firme, coerente, radical, imparcial, irredutível na defesa dos direitos das pessoas portadoras de necessidade educativas especiais. Rosita Édler Carvalho, conciliadora, pacificadora, me fez ver que o tempo acalmaria meu coração para entender e militar nesta causa, e que era tempo, o que eu precisava, para hoje compreender Maria Tereza e admirar sua obra.

Mais adiante, me especializei também em Avaliação Educacional pela UNEB, na tentativa de explicar através da avaliação consciente os fenômenos que circundam a educação de pessoas. Neste curso, além de aprendermos a lidar com a avaliação que transforma o aluno moralmente, descobrimos também a avaliação institucional como precursora da reforma educacional que precisa acontecer em nosso país, e que só é possível a partir de pequenas ações cotidianas, do compromisso de cada indivíduo com a vida.

5. MINHA ATUAÇÃO PROFISSIONAL

Foram várias as oportunidades profissionais que tive ao longo de minha carreira docente. Sou fruto das vivências aqui narradas dona das experiências que ainda aguardam ser vividas, porque novas etapas da vida surgem a minha frente, novos desafios despontam.

O grande desafio que tenho, irmanada a tantos outros profissionais que atuam na Educação brasileira, é através da pesquisa reescrever percursos, pois, cada aluno presente na escola brasileira traz um projeto de vida único a ser visto e valorizado pelo professor. É necessário tirar determinados grupos da invisibilidade que tomou conta de nosso cenário educativo. Precisamos rever currículos e pensar numa escola que atenda às diferenças democráticas presentes em nossas salas de aulas. Não podemos concordar que se perpetue a discriminação presente nos livros didáticos, nas posturas docentes e as barreiras arquitetônicas e atitudinais que negam o acesso educacional a tantos alunos brasileiros.

Ao atuar na Educação Especial como professora e formadora de professores, um dos princípios mais marcantes discutidos à exaustão foi a formação ética do ser humano, pois pensar de forma ética nos leva a compreender o real sentido de estar no mundo e fazer parte de uma cadeia de relações que, quando em harmonia concorrem para a paz enquanto consciência da necessidade do diálogo entre os grupos sociais. A tolerância em esperar o tempo do outro; a forma de aprender do outro, que não é igual ao seu tempo e a sua forma de aprender, e nem por isso é inferior.

O respeito a diversidade é ensinado em casa e principalmente na escola, local de formalização do conhecimento. Tudo o que a escola produz converte-se em verdade, principalmente para as crianças. Por esse motivo o meu cuidado com a educação das crianças e a necessidade de estudar mais efetivamente os processos de Inovação Pedagógica, para buscar respostas capazes de promover inclusão através da democratização do conhecimento relativo a educação dos grupos sociais excluídos. Contribuir para reescrever a história de tais grupos assegurando sua alteridade e a mudança do imaginário social vigente sobre os mesmos. Índios, remanescentes de quilombos, homossexuais e o meu grupo de trabalho que especificamente são os portadores de deficiência intelectual na APAE de Jacobina, onde trabalho desde 1993 e de todas as escolas onde esse grupo se insere.

Em julho de 2009, inicie meu trabalho na UNEB, Campus XVI, na cidade de Irecê. Minhas atividades com ensino superior iniciaram em 2006, no Instituto de Ensino Superior Capimgrossense – ISEC, instituição particular na vizinha cidade de Capim Grosso. Tal experiência foi responsável pelo desejo de atuar no ensino superior e prestar seleção para a UNEB, experiência que está apenas começando e que me tem agradado muito.

É prazeroso voltar à instituição onde fiz a minha Graduação e trabalhar com a Disciplina Prática Pedagógica oportunizando as discussões que tenho protagonizado sobre formação ética e moral humana, currículo e postura docente. No curso de Letras uma de minhas grandes preocupações é a formação docente dos alunos, aquela que transcede a prendizagem dos conteudos do curso de Letras, existe a necessidade de que os alunos pensem na transposição didática de tais conteudos, além é claro de saber Literatura, Linguistica, Gramática...

4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

SOARES, Magda. Metamemória-memórias: travessia de uma educadora. São Paulo: Cortez, 2001.

NASCIMENTO, Antônio Dias, O difícil caminho da ética na contemporaneidade. Uma leitura de Zygmunt Bauman. Texto xerocopiado

PERRENOUD, Philippe. A Prática Reflexiva no Oficio de Professor: Profissionalização e Razão Pedagógica. Porto Alegre, RS: Artes Médicas, 2000.