Ouvi esta pergunta em vários noticiários de hoje, quando se comentava
mais um acidente de transito que vitimou um ciclista. Em minhas andanças pelas
estradas brasileiras e nas cidades em que costumo dirigir, já me fiz essa
pergunta várias vezes, quando fui brutalmente agredida no transito por
motoristas impacientes, inconsequentes, irresponsáveis... A violência não se
caracteriza só pelo acidente em si, mas pela forma como se trata o motorista ao
redor: xingamentos, pressão para ultrapassar, farol alto para dizer sai da
frente que minha camionete vai passar por cima de você, buzinaço para advertir
que sou maior, mais possante ou mais brutal! Isso assusta, intimida e com o
tempo também embrutece... Vejo pessoas delicadas em uma conversa comum, repetindo
essas agressões, o corpo apresenta um tono diferente, uma aspereza nas palavras,
umas rugas grosseiras no rosto, um escurecimento da aura. Às vezes me vejo embrutecida
com a irresponsabilidade do outro: parar em mão dupla ou no meio da rua para bater
papo, “passear” lerdamente enquanto o resto do mundo tem pressa... Eu tenho
pressa, eu tenho horário, eu preciso chegar!
Êpa! De onde veio nesse momento essa minha irritação? Respirando...
Vamos parar um pouco inclusive eu, que não sou santa, e chegada à
velocidade, sempre com “muita segurança”... Vamos pensar no que nos faz monstros
em várias situações, já que os padrões de comportamento humano geralmente se
repetem, não há regras, mas há recorrência.
Pensemos no ser humano nas situações de poder, pois acredito que estar
no poder é muito responsável pela sensação de onipotência desenvolvida
instantânea e também efemeramente em nós, seres humanos. Já dizia Abraham
Lincoln: "Quase todos podemos suportar a adversidade, mas se quereis
provar o caráter de um homem, dai-lhe poder." Pensemos superficialmente em
casos atualmente na mídia: O que levou o goleiro Bruno a deixar que Elisa
morresse? O que leva a maioria dos políticos a praticar seus atos de corrupção?
O que leva os donos de estabelecimentos públicos a não seguirem as Normas
Técnicas para edificações e colocarem a nossa vida em risco? Penso que é a sensação
de poder nutrida por todos. O poder nos faz sentir acima dos demais seres humanos,
inatingíveis, intocáveis, inalcançáveis pelas mazelas, pela justiça, pela
doença...
Mais uma vez e como professora, penso na educação, temos que pensar a
educação das pessoas e também educar para a possibilidade de ter... Alguns de
nós já se preocupa em educar o ser...agora educar o ser consiste em educar a
possibilidade de ter, já que vivemos num país onde um operário chegou á
Presidência da República e centenas de garotos esperam uma chance para virar
milionário no futebol... Alguns ficarão ricos, alguns chegarão ao poder...
Outros já nascem ricos nesse país nem por isso o poder lhes deixa de fazer a
cabeça... Conseguimos o direito de dizer o que queremos, de fazer o que achamos
conveniente, quando aprenderemos a lidar com o poder?
Não tenho a pretensão de dar respostas e quem sou eu para dar as
respostas?... Apenas aprendamos a controlar o nosso poder, acendamos a nossa
luz amarela interior quando o nosso “poder” estiver tão grande, tão forte, tão
descontrolado a ponto de nos transformar naquilo que não queremos ser:
monstros, destruidores de nossa própria raça! Você já mediu seu poder hoje? Não
adianta dizer-se sem poder, abaixo de alguém, sempre tem alguém se sentindo
nada, inferior, é dai que vem a força do poder... Encontremos o equilíbrio!
Rezo por todos e por mim... Que nossa bicicleta não seja a arma contra o pedestre.
Que nossa moto não seja a arma contra o ciclista, o skatista e o pedestre. Que
nosso automóvel não seja a arma a tirar a vida de todos os outros condutores
que parecem menos poderosos que nós. E que ninguém se sinta mais poderoso que
nós a ponto de se achar no direito de tirar nossa vida!